O Cheiro da Saudade



Era verão. A estação de Trem de Willingdon estava lotada. Todos voltavam para casa. Já eram seis da tarde. O sol estava se pondo. No fundo de toda aquela gente, via-se apenas um ponto avermelhado brilhando. Ele estava inquieto. As orelhas, em pé. E sua cauda balançava, rapidamente, no ritmo de sua ansiedade. O pêlo parecia queimar sob a luz do sol. Ele parecia um pouco cansado. Porém, isso não era motivo para desmotivá-lo.

Já era hábito. Todos os dias, a mistura de pastor alemão com vira-lata deixava o que estava fazendo e ia até a estação. Lá, sempre por volta daquele mesmo horário, recebia seu dono, que voltava do trabalho. Era um pobre comerciante, que adorava a companhia de seu fiel cão. Gostava tanto, que nenhum abraço, carinho, mordida ou petisco era capaz de mostrar o quão eram amigos.
À medida que as horas passavam, o movimento e o número de pessoas na estação de trem ia diminuindo. O pobre cão não via seu dono. O que o cão não sabia era que, sadio e forte, o pobre rapaz fora convidado a entrar no exército, para lutar por sua nação, alguns dias antes.

Quando em combate, o rapaz fez de tudo. Infelizmente, o pior acontecera. Todos os amigos e familiares estavam tristes. Inconsoláveis. Menos o cão. Ele estava lá, firme e forte. E acima de tudo, alegre. Incansável.
Mas será realmente que o pior acontecera? Seu olfato, muito apurado, percebera que essa história poderia ter um final diferente! E não só isso: ele sabia que seu dono estava por perto! Ele o procurava em todas as partes. Revistou toda a estação. Nenhum sinal dele.

Ele não desiste. No dia seguinte, volta à estação para recebê-lo - ou pelo menos para procurá-lo. Desta vez, tem certeza de que está por perto - é certeza, mesmo! Ele sente o seu cheiro. Está chegando perto. Cada vez mais próximo...
Chegou. Ele o encontrara. O pobre moço estava muito sujo. Aparentava ter vindo de uma guerra. O cão já estava no auge de sua felicidade quando... quando... Ao olhar em seus olhos, o cão não via o mesmo brilho que via em de seu dono. O cão não reconhecia aquela pessoa. Era um ser totalmente diferente: seus cabelos eram crespos, sua pele, escura. Definitivamente, aquele não era seu dono. O que ele não sabia era que a viúva do tal rapaz havia doado suas roupas - justamente para aquele mendigo.
Talvez seja assim que ele leve o resto da vida: se hoje não encontrar seu dono, amanhã ele estará de volta. A esperança de um dia voltar a abraçar o seu maior amigo vai ser, provavelmente, a última a morrer.

(Ludgero Baptista - 2008)

Comentários

JFC Silva disse…
Bem, pessoal!!! Para mim, esse é um dos textos mais emocionantes que já fiz!
Eu o enviei para um concurso de contos no segundo semestre de 2008. Não ganhei nada! hahaha Mas mesmo assim, o adoro!

Espero que vocês também gostem!
Um abração a todos!
FUI!

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